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Ecologia da restauração e a restauração da ecologia


Por: Efraim Rodrigues
                                                                               

Há mais de um século, que um fulano cujo nome não vai fazer diferença alguma para você, criou uma nova ciência que pretendia estudar a relação entre os seres e seu ambiente. Na época, o impacto disto fora da academia, deve ter sido tão grande quanto o do campeonato de “air guitar”, em São Paulo na semana passada. Quem sabe, no futuro vai ser comum ver marmanjos treinarem para ver quem finge tocar guitarra melhor. Talvez até se criem departamentos nas Universidades para estudar isto. Hoje é só uma maluquice de uma tribo. Assim era a ecologia quando ela foi criada.

Os problemas todos por que passa nosso planeta fizeram a ecologia descer de sua torre de marfim para as páginas dos jornais (até para as páginas policiais, em alguns casos), e de lá para a cabeça das pessoas, mas o ecólogo, ainda hoje é visto como um teórico das coisas subjetivas, do longo prazo, pouco pragmático.

Quando, por exemplo, um ecólogo fala do ciclo dos 5Cs na história brasileira, (Café, Cana, Capim, Cupim, Caos), ele é recebido com um comentário do tipo, - É o desenvolvimento.

Os problemas todos por que passa nosso planeta também fizeram os ecólogos descerem da torre de marfim para a Terra (e também para a terra!) para consertar os problemas causados.

A sociedade agora nos coloca diante de um objetivo claro de consertar as bobagens realizadas anteriormente, e tem investido recursos de diferentes formas neste objetivo. As pessoas envolvidas neste esforço têm se referido a ele como ecologia da restauração, ou seja, seria um ramo da ecologia preocupado com a restauração de ecossistemas.

O impacto nos meios ecológicos tem sido tão grande que a Ecologia da Restauração tem causado a Restauração da Ecologia.

A idéia não é nova. Em meados do século passado, Dom João VI ordenou que os manancias do Rio de Janeiro fossem reflorestados. Um certo Major Archer então plantou 95.000 mudas na área que se tornaria a Mata da Tijuca no Rio de Janeiro. Isto fala um pouco sobre a baixa auto estima brasileira. Enquanto os gringos escreviam no papel o que seria a ecologia, nós já estavamos fazendo. Mesmo assim, professores brasileiros, em salas de aula idem, falando para alunos idem, repetem que a Ecologia foi criada por Haeckel em 1869 na Alemanha. NÃO!!! Os teóricos que me perdoem, mas o Major Archer merece mais créditos do que Haeckel. O conhecimento dele de campo, em detalhe, percebendo que espécies cresciam melhor em quais sítios, como proceder para obter maior pegamento, vale mais do que sentar em uma mesa, e enunciar que a ecologia é a ciência que relaciona seres com seu meio. Pelo menos me parece mais produtivo.

Esta missão nova que recebemos trouxe com ela uma preocupação com eficiência da aplicação de recursos. Se voce me dá X reais para restaurar áreas, é natural que eu vá pensar em modos de gastar o mínimo para restaurar o máximo. A Ecologia da Restauração tem uma certa cara de engenharia, o que não é mau. Só na Torre de Marfim que se pode gastar tempo pensando em situações onde dinheiro não conta. Aqui embaixo, a quantidade de recursos para resolver diferentes problemas é finita, e tem que ser alocada de maneira eficiente.

As experiências com ecologia da restauração são inúmeras, e cada uma delas nos ensina um pouco mais sobre como fazer mais fácil e mais barato. Em Aymorés, por exemplo, o fotógrafo Sebastião Salgado está restaurando a floresta em uma propriedade da família, em Vitória a Universidade Federal do Espírito Santo restaurou um lago, no litoral paranaense o ecossistema marinho está sendo restaurado. De ciência de gabinete a Ecologia da Restauração transformou a ecologia em ação. Ação que gera empregos, movimenta dinheiro, conserta o ambiente e injeta oxigênio na ciência, com novas perguntas e duvidando de algumas certezas que se estabeleceram mais por repetição do que por experimentação.

A ecologia trouxe a restauração para a sociedade, e a sociedade trouxe a restauração para a ecologia.